sexta-feira, 22 de maio de 2020

A ÉTICA DO VÍRUS


Qual é a responsabilidade ética do coronavírus - um bichinho nanométrico, invisível, que nem sequer é tido pelos biólogos como um ser vivo?
Não estou a fazer piada ou brincar com vocês, queridos leitores. Coloco essa pergunta em função do surgimento, nos EUA, de processos bilionários exigindo reparação aos chineses pela disseminação do covid-19.
É evidente que o comportamento de um vírus está fora das categorias do que é ético ou não. Para que esses processos possam ter algum sentido e não caiam no ridículo, seria preciso nacionalizar o vírus - chamá-lo de “chinês” - e provar que foi fabricado em algum laboratório de biotecnologia da China.
Pois bem: digamos, contrariando o que dizem os cientistas respeitáveis de todo o mundo, que essa hipótese esdrúxula fosse verdadeira. Então seria preciso explicar porque os chineses, ao fabricarem essa criatura, iriam soltá-la em seu próprio território a fim de exterminar os próprios chineses. Um acidente involuntário?
Segundo ponto. Mesmo que essa narrativa fantasiosa prosperasse, os chineses poderiam argumentar: “Certo. Eu pago se antes vocês indenizarem a humanidade pela morte de um quarto da população mundial em função da gripe espanhola” (que, apesar do nome, surgiu nos EUA).
Veremos em breve o surgimento de uma disputa jurídica planetária, no contexto de uma guerra comercial entre os EUA e a China, visando a hegemonia global?
Acho bastante plausível, nesses tempos estranhos e insólitos.
A verdade é que esse novo vírus mata indistintamente a todos - velhos ou jovens, brancos ou pretos, ricos ou pobres, orientais ou ocidentais. Se há algum sentido nessa força cega da natureza que devasta a humanidade, é explicitar as doenças e mazelas da civilização, especialmente o abismo profundo entre ricos e pobres, e o impacto devastador da presença humana no planeta.
Talvez esse segundo fato explique porque o vírus surgiu num país com a densidade demográfica da China e numa região tão tecnologicamente avançada como Wuhan.
José Ramos Coelho – 26/04/20

Nenhum comentário:

Postar um comentário